Primordial importância é a internalização dos ensinamentos do CRM(Crew Resource Management) para que as ferramentas adequadas ao processo decisório sejam conhecidas e de fato utilizadas pelos tripulantes
No Relatório Final emitido pelo CENIPA ,referente ao acidente ocorrido com um Airbus 320 em 03MAR2019, é possível verificar a forte influência do fator operacional e do fator humano. De acordo com a International Air Transport Association (IATA) , muitos acidentes durante a aproximação e pouso possuem como fator contribuinte um deficiente processo decisório aliado a uma comunicação ineficaz, indicando que muitas vezes são a consequência da incapacidade da tripulação em responder adequadamente aos acontecimentos anteriores. Por isso, de primordial importância é a internalização dos ensinamentos do CRM(Crew Resource Management) para que as ferramentas adequadas ao processo decisório sejam conhecidas e de fato utilizadas pelos tripulantes. O que, nas palavra de Henry Ford: “Antes de nada, estar preparado é o desfecho do êxito”.
OCORRÊNCIA SIPAER
Histórico
Durante a aproximação sob Condições de Voo por Instrumentos (IMC) para a pista 15, do Aeródromo Antônio Carlos Jobim (SBGL), Rio de Janeiro, RJ, os pilotos obtiveram contato visual com a pista de pouso ao cruzar, aproximadamente, 800ft de altitude, prosseguindo para o pouso com referências visuais.
O toque ocorreu à direita do eixo central da pista, distante cerca de 900 metros da cabeceira 15. O trem de pouso principal direito tocou fora do limite lateral direito da pista. A aeronave percorreu, aproximadamente, 660 metros fora da pista de pouso, em área gramada dentro dos limites da faixa de pista (STRIP).
A aeronave teve danos substanciais. Os tripulantes e os passageiros saíram ilesos
Análise:
Apesar das condições meteorológicas se mostrarem bastante degradadas na região do Rio de Janeiro no momento da chegada, em nenhum momento elas ficaram abaixo dos mínimos preconizados pelo MGO da empresa, bem como em todas as legislações pertinentes sobre o tema.
A tripulação foi informada pelo APP RJ de que SBGL encontrava-se com 3.000m de visibilidade, chuva forte e trovoada, e a tripulação avaliou que, de acordo com as normas da empresa, era possível prosseguir na aproximação.
De acordo com os relatos e a análise dos dados da descida, a aeronave realizou uma aproximação estabilizada até, aproximadamente, 490ft, quando ocorreu uma mudança significativa do vento. O comandante chegou a identificar e anunciar, cruzando aproximadamente 100ft de altura, que a aeronave estava fora do eixo da pista. O copiloto confirmou essa informação, demonstrando que estava ciente da situação operacional.
Verificou-se que as ações iniciais do comandante corresponderam ao preconizado no FCTM. Contudo, a aeronave não estava mais voando em direção à faixa central da pista e as correções não foram suficientes para reconduzir a aeronave para o centro do eixo.
O copiloto não cogitou interferir no comando da aeronave porque, segundo seu relato, ele considerou que não era uma situação de incapacitação do piloto em comando e confiou na informação do comandante de que estava corrigindo a posição.
A 30ft de altura, o copiloto realizou novo callout com relação ao alinhamento da aeronave, porém, não houve mais nenhuma resposta do comandante. A partir desse momento, as condições meteorológicas se degradaram ainda mais, com o aumento da intensidade da chuva sobre o aeródromo, a ponto de prejudicar a visão periférica dos pilotos, comprometendo a exata noção de profundidade da aeronave em relação à pista.
O copiloto informou por diversas vezes que a aeronave estava fora do eixo da pista. O comandante cotejou a correção algumas vezes, contudo, não houve a atuação de forma efetiva nos comandos de voo para corrigir essa situação. Em nenhum momento houve o callout para início do procedimento de aproximação perdida.
Por estar próximo ao solo, já sobrevoando a pista, o comandante não considerou a possibilidade descontinuar o pouso e prosseguir para a alternativa como uma ação viável. Ele informou estar “commited to land” (sic) (comprometido com o pouso) e que, para evitar um pouso mais pesado, foi modulando o flare com o empuxo dos motores.
Embora os tripulantes estivessem com seus treinamentos em dia e os considerassem adequados, é possível supor que a não aplicação dos procedimentos recomendados nos manuais do operador e do fabricante da aeronave decorreu da não compreensão da condição de desestabilização, uma vez que identificaram o desvio lateral da aeronave e nele mantiveram o foco até o pouso.
O contato da aeronave com o solo ocorreu cerca de 916m distante da cabeceira 15, com o trem de pouso principal direito fora dos limites laterais da pista, velocidade de 121kt, razão de descida de 400ft/min, proa magnética 140º e trajetória de voo 149º. Após o toque, a aeronave percorreu 668m fora da pista de pouso. O comandante recuperou o controle da aeronave e reconduziu-a para dentro dos limites internos da pista 15.
Fatores Contribuintes
Coordenação de cabine – contribuiu
Quando a aeronave voava abaixo de 100ft de altura, o copiloto realizou diversos callouts informando que a aeronave estava fora do eixo da pista. O comandante cotejou os primeiros, entretanto, a partir de certo momento, não mais atendeu apropriadamente aos callouts do copiloto e prosseguiu para o pouso, a despeito dos seguidos alertas recebidos.
O copiloto, mesmo percebendo que as correções do comandante não eram suficientes para controlar a aeronave e retorná-la ao eixo central da pista, não solicitou ao comandante, de forma mais assertiva a execução de uma arremetida em voo.
Isso denotou que os tripulantes tinham informações suficientes para descontinuar o pouso, mas optaram por não utilizar esse recurso, o que contribuiu para a ocorrência.
Processo decisório – contribuiu
Houve uma análise comprometida das informações disponíveis aos tripulantes, de modo que a condição de desestabilização da aeronave não foi considerada, bem como a degradação meteorológica na curta final, culminando na decisão de tentar corrigir a aeronave até o último instante, ainda que sem resposta, e prosseguir com o pouso em SBGL.
Créditos: Texto extraído do Relatório Final A-036/CENIPA/2019, referente ao ACIDENTE ocorrido com a aeronave PR-OCW em 03MAR2019.
- LINK: INFORMATIVO SERIPA VII
- LINK CENIPA: RF A-036/CENIPA/2019 PR-OCW – 03/MAR/2019
- LINK FSF: ALAR Brief Note 7.1, 2009.
- LINK IATA: Unstable Approaches: Risk Mitigation Policies, Procedures and Best Practices, 2nd Edition, 2016.
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Ezequias Andrade
06/06/2021, 14:38Belíssimo artigo abordado pelo colega, pois o trabalhar em equipe é importante visto que, o prepara para os diferentes cenários em que isso se faz necessário. Parabéns pelo trabalho.
REPLYDesejo-lhe sucesso.