Segurança de Voo e os cuidados no dia a dia para evitar acidentes.Por Ezequias Dos Santos

Segurança de Voo e os cuidados no dia a dia para evitar acidentes.Por Ezequias Dos Santos

Quando falamos em segurança de voo, devemos levar em consideração a existência de uma teoria muito interessante, no qual o acidente só acontece quando vários fatores estão alinhados.

Falar sobre segurança de voo é um tema importante, pois se trata do nosso cotidiano, visto que estamos o tempo todo pensando no assunto em todos os níveis: segurança de voo, segurança operacional e muitas vezes nem percebemos que estamos agindo preventivamente, senão vejamos: quando o pai entra no carro e coloca seu filho (a) na cadeirinha e amarra a mesma no banco traseiro, neste momento, estamos pensando em segurança, ao aplicar medidas preventivas para mitigar ou minimizar os riscos. Visto que, o carro desenvolve velocidade, energia cinética e envolvem outros carros na via, existindo desta forma, um perigo inerente a esta atividade de dirigir e assim, é necessário gerenciar tais riscos para mitigar tais perigos, evitando assim um acidente.

Nesta essência, podemos destacar diversas maneiras para gerenciar e mitigar ou minimizar os riscos veja algumas: a missão primordial na segurança de voo é promover a prevenção de acidentes aeronáuticos, preservando assim os recursos humanos e materiais, visando o crescimento da aviação no Brasil e no mundo.

Sendo assim, a recomendação de segurança de Voo (RSV) é uma proposta de uma autoridade de investigação de acidentes com base em informações derivadas, feita com a intenção de prevenir ocorrências aeronáuticas. Sendo que não tem nenhum objetivo de criar uma presunção de culpabilidade ou de responsabilidade, visto que tal análise ficará a cargo das autoridades competentes (Polícia Judiciária, Ministério Público e Judiciário).

Portanto, diria que a finalidade da investigação é apurar todas as causas que levaram aquela ocorrência existir, objetivando adotar as devidas ações corretivas, evitando que aconteçam outros incidentes/acidentes.

Assim, numa coleta de dados eventual, o Órgão responsável pelas investigações (CENIPA/SERIPA), detém a competência legal para realizar a investigação com o objetivo único de evitar recorrência.

Deste modo, quando falamos em segurança de voo, devemos levar em consideração a existência de uma teoria muito interessante, no qual o acidente só acontece quando vários fatores estão alinhados. Portanto, este é o primeiro conceito importante para termos quando falamos sobre segurança operacional.

Neste quesito, é fundamental seguir os quatro passos da cultura de segurança: a) a contribuição individual, pois compreender que a segurança das operações depende também de sua e de minha participação, é de extrema necessidade, b) informação de qualidade, é fundamental identificar e reportar os pontos potenciais de falibilidade, c) gerenciamento dos riscos, analisando as ocorrências e principalmente divulgando as lições apresentadas d) operação mais segura que é a consequência.

Cumpre destacar ainda, que quando falamos em teorias, podemos citar algumas:

Teoria das causas múltiplas (homem, máquina e meio), pois tal trinômio tem como o “homem”, o elemento principal a ser investigado, uma vez que é dele que parte a tomada de decisões, agindo assim de acordo com elas. Portanto, é por este motivo que consideramos a chave fundamental para se iniciar as investigações aeronáuticas.

Trinômio da Segurança de Voo

Por outro lado, a “máquina” não pode ser ignorada, uma vez que ela deve proporcionar o ápice da credibilidade, confiabilidade e segurança para o homem/piloto que está operando o equipamento.

Podemos dizer que no caso do avião, os procedimentos de segurança devem ser rígidos, pois ao especificar a troca de peças, estas devem ser cumpridas à risca, uma vez que já ficou comprovada a vida útil destas. Uma aeronave bem cuidada, com suas manutenções em dia sempre estará em perfeitas condições de uso.

Por fim, o “meio” é o último elemento que devemos investigar, pois este se refere às condições dos riscos ambientais onde trafegamos, como exemplo: podemos citar o asfalto em má conservação, os fenômenos atmosféricos entre outros. Nota-se que ter uma boa manutenção das vias, verificar as condições do tempo, são de extrema necessidade de um excelente piloto, sendo assim, os prognósticos do piloto em relação ao meio, são fatores de segurança para evitar o acidente.

Por outro lado, a teoria de Herbert William Heinrich, também conhecida como “Causa Única” ou “Teoria do Dominó”, foi e continua sendo de grande importância em especial na atenção das ocorrências de menor

grandeza. Esta teoria nos mostra que o acidente e consecutivamente a lesão, pode ser causado por alguma atitude anterior e este, é o gatilho que se encontra com o trabalhador.

Neste sentido, esta teoria determina que as causas dos acidentes estão relacionados com: a personalidade, falha humana, causa dos acidentes, o acidente e a lesão, que por sua vez, sua teoria, desenvolveu uma relação de 300:29:1. Para cada acidente com lesão grave ou até mesmo fatal, havia 29 acidentes com lesões leves e 300 acidentes sem lesões, ou seja, sem resultar em nenhum ferimento.

Importante destacar Teoria de Bird que é uma teoria mais ampla, visto que podemos analisar outros casos como: quase acidentes; acidentes com perdas materiais; acidente leve e o acidente grave.

Ao observar a pirâmide de Bird, o “quase acidente” é uma ocorrência imprevista que não resultou em ferimentos, doenças ou danos, porém tinha um potencial de fazê-lo, ou seja, é uma atitude que pode resultar em acidente, mas não passou de um susto. Podemos citar como exemplo, o piloto que ao descer a escada pisa no degrau e quase cai, porém o que evitou o acidente foi o corrimão.

Já o “acidente com perda material”, é aquele acidente no qual o mecânico de aeronave realizando reparo na asa do avião e quando esta descendo a escada carregando um material frágil, pisa no degrau, perde o equilíbrio, todavia para não cair solta o material para segurar no corrimão, ocorrendo somente a perda material, o que fica caracterizado como acidente com perda material, portanto é algo a mais para se apurar.

Por outro lado o “acidente leve” é aquele que o tripulante descendo a escada, pisa no degrau e sofre uma pequena torção.

E por fim, o “acidente grave” é aquele que o piloto cai da escada e sofre fratura na perna.

Podemos notar nestes breves exemplos que se tivessem ocorrido uma investigação na base da pirâmide, o acidente grave não teria ocorrido.

Vejamos abaixo o triângulo de Frank Bird:

A luz do exposto, podemos observar que a Teoria de Bird tem um potencial a mais, qual seja, o fator “acidente com perda material”. Até porque, qual empresário não gostaria de saber as causas destas perdas? Portanto, para se eliminar estas perdas, é preciso investigar as causas raízes.

Porém, se atentarmos para o que diz o psicólogo inglês James Reason em seu livro de 1997, “Managing The Risks of Organizational Accidents”, o qual desenvolveu o modelo do “queijo suíço”, ou como podemos chamar “A trajetória da oportunidade”, somos capazes de notar que as análises investigativas de um acidente é a sequência causal de falha humana, podendo haver tantas falhas ativas quanto falhas latentes. O acidente ocorreria quando todas as falhas fossem alinhadas.

A falha ativa é representada pelo ato inseguro cometido pelas pessoas que estão em contato direto com os processos e geralmente têm um impacto de curta duração sobre as barreiras.

Por outro lado a falha latente  é representada através de patologias intrínsecas dos processos, que aparecem através das decisões dos diretores, gerentes, engenheiros, elaboradores de procedimentos. Ou seja, as condições latentes têm dois tipos de efeitos adversos: podem contribuir para o erro no local de trabalho como, por exemplo: (sobrecarga de trabalho, equipamentos inadequados, e inexperiência) e/ou podem criar fragilidades duradouras nas barreiras como: (procedimentos não cumpridos, projetos mal elaborados, etc.). As condições latentes podem ficar adormecidas nos processos por décadas.

Podemos citar como exemplo: A investigação realizada com a aeronave Airbus A-320 da TAM, de matrícula PR-MBK em 17 de julho de 2007, ocorrido por perda de controle no solo.

Na investigação(http://sistema.cenipa.aer.mil.br/cenipa/paginas/relatorios/rf/pt/pr_mbk_17_07_2007.pdf)nota-se que a aproximação ocorreu normalmente, porém a aeronave operava com o reversor do motor–2 desativado, a pista estava molhada e escorregadia e após o pouso, a aeronave não desacelerou como era de previsto. A aeronave perda a reta para a esquerda, saindo da pista pela lateral, cruzando a avenida e atingindo um posto de combustíveis e um edifício da própria empresa, causando a morte de 187 pessoas a bordo e de outras que estavam em solo. Podemos citar algumas causas abaixo que contribuíram para o acidente como:

A aeronave encontrava-se o reversor do motor nº 2 desativado;

O registro de dados do voo (FDR – Flight Data Record), não registrou nenhuma mudança do manete do motor 2;

O pouso se deu com os manetes fora da posição recomendada;

A falta de um sistema para alertar os pilotos de eventual posição inadequado dos manetes;

Falha do operador para recuperar registros de manutenção destruídos no acidente, ou seja, o operador não possuía um backup;

Falta de inspeção e de homologação nas obras do aeroporto de Congonhas,

A pista principal de Congonhas não dispunha de RESA – Runway End “Safety” Area (área de segurança do fim da pista).

A pista do aeródromo com condição precária referente a atrito e anomalias na sua superfície, possibilitando assim, o acúmulo de água.

Pista principal de pouso e decolagem com falta de grooving (ranhuras transversais), tal sistema de segurança evitaria o acumulo de água na pista.

Ou seja, tais falhas ou violações, somadas a outras condições, causam os eventos adversos. Logo, a falha ativa provoca um impacto imediato e direto. Já falha latente, são “brechas”, situações de risco dentro do sistema que, ao se combinarem com as falhas ativas, criam a oportunidade para o evento adverso.

Avaliando estas poucas causas e se colocarmos na teoria de James Reason, ficaria da seguinte maneira:

A teoria Reason, propõe que todo perigo possua barreiras e salvaguardas, e que na ocasião de um acidente é fundamental detectar como e porque estas barreiras falharam.

Isto significa que, as salvaguardas em um caso hipotético deveriam ser íntegras, porém na realidade todas possuem falhas (Ativas e Latentes), os buracos do queijo. As barreiras em separado e desalinhadas não chegam a interferir nos processos, porém quando há o alinhamento delas de forma que os buracos sejam ultrapassados, ocorre o acidente.

Nota-se que um acidente nunca decorre de apenas um fator, pois quando alinhado, ficam caracterizados as causas raízes que levaram aquele trágico acidente. Por isso, é importante conhecermos todos os fatores que contribuíram para a ocorrência, até porque a principal causa pode não estar evidente. Para concluir, posso dizer que sou adepto a Teoria de Bird e a Teoria de James Reason.

Não obstante, o relatado acima, podemos citar também o caso do voo 4896 da NOAR Recife-PE, pois no início da decolagem ocorreu a perda de potência no motor esquerdo, neste momento, se o comandante tivesse escutado o copiloto e abortado o voo, provavelmente os danos seriam menores(http://sistema.cenipa.aer.mil.br/cenipa/paginas/relatorios/rf/pt/pr_nob_13_07_11.pdf)

Contudo, a conclusão das investigações, o processo decisório, a dinâmica de equipe (comandante & copiloto), a formação, capacitação e treinamento da equipe e a cultura organizacional contribuíram, como aspectos psicológicos, para que o acidente acontecesse. E do ponto de vista operacional, a aplicação de comandos, a coordenação de cabine, a instrução, o julgamento de pilotagem e a supervisão gerencial contribuíram de forma comprovada para a queda do bimotor.

Neste mesmo sentindo, se aplicarmos a teoria do psicólogo inglês James Reason, teoria do “queijo suíço”, ou como podemos chamar “a trajetória da oportunidade”, podemos notar que as falhas mecânicas, humanas e de treinamento, ou seja, (homem, máquina e meio), contribuíram para a queda da aeronave LET-410 da Nordeste Aviação Regional Linhas Aéreas (Noar Linhas Aéreas), que caiu a cem metros da praia de Boa Viagem, Zona Sul Recife, matando 16 pessoas, em julho de 2011.

Portanto, o acidente é sempre um acontecimento complexo que coloca em jogo grande número de fatores independentes. E pode ser considerado como uma série de pequenas situações que não foram observadas e também não receberam a tratativa adequada, que somadas, resultam no acontecimento de uma ação indesejada “o acidente”.

Posso afirmar que, quando discutimos diversas teorias sobre acidentes, entendo que não existe uma teoria mais adequada que a outra.

O que existe é grandes estudiosos do assunto, adequando aquele ponto que faltou naquela época, seja em sua própria teoria ou talvez inovando a teoria de outro pensador, aplicando assim, naquele cenário a busca de diferentes causas raízes ao acidente.

Resta cristalino que, os mesmos princípios aplicados em segurança de voo aplicam-se em segurança operacional.

Fonte: CENIPA

http://sistema.cenipa.aer.mil.br/cenipa/paginas/relatorios/rf/pt/pr_mbk_17_07_2007.pdf

http://sistema.cenipa.aer.mil.br/cenipa/paginas/relatorios/rf/pt/pr_nob_13_07_11.pdf

Sobre Ezequias dos Santos

Ezequias dos Santos Andrade – Técnico de Segurança do Trabalho, com formação acadêmica em Direito – pela Universidade UNIFIEO; credenciado como membro ELO-SIPAER, matrícula SIPAER-19151, pelo CENIPA – Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes, (CPAA-2º semestre/2019).

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andradeezequias@gmail.com

 

 

 

17 comentários
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17 Comentários

  • NEEMIAS DOS SANTOS ANDRADE
    04/06/2021, 18:00

    Muito bom o artigo escrito , com muita propriedade e com excelente descrição dos fatos.

    REPLY
  • PinaLima
    04/06/2021, 19:32

    Muito bom… EXCELENTE!!

    REPLY
  • Edward Khunha
    04/06/2021, 20:33

    Excelente artigo. Ezequias é um grande profissional na área de segurança.este artigo sinaliza e coopera para um.novo marco na sua trajetória profissional. Parabéns pelo feito.

    REPLY
  • Edward Khunha
    04/06/2021, 20:58

    Excelente artigo. Ezequias é um grande profissional na área de segurança e neste artigo, sinaliza e coopera para um novo marco na sua trajetória profissional. Parabéns pelo feito.

    REPLY
  • Edna Póvoa
    04/06/2021, 21:58

    Parabéns pelo trabalho publicado, que só enaltece e contribui pela seriedade que é o trabalho do profissional em segurança do trabalho. Sucesso sempre.

    REPLY

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