O sucesso depende de saber entender o mercado e ser flexível na sua proposta de solução.
Muito se fala sobre o sucesso da Embraer. Exemplos muito comuns citados para explicar esse sucesso são a sua capacidade de identificar nichos de mercado na aviação comercial, assim como a sua capacidade técnica no desenvolvimento de aeronaves cumprindo metas de desempenho e prazo. Entretanto, um dos segredos desse sucesso nos negócios, do qual pouco se fala, é o aprendizado derivado de seus fracassos.
O caminho seguido pela empresa para aeronaves de transporte civil, desde o seu início até a família de aeronaves ERJ, pode ser resumido em apenas uma frase: sucesso a partir do aprendizado de um fracasso anterior.
O sucesso depende de saber entender o mercado e ser flexível na sua proposta de solução.
O primeiro par nesse caminho é composto pelo protótipo do Bandeirante (EMB-100) e a versão comercializada do Bandeirante (EMB-110). Foram 3 protótipos do EMB-100, que contemplava até 8 passageiros; a aeronave comercializada, com cerca de 500 entregas, chegou a ter versões de até 19 passageiros. A principal lição foi ter uma visão do cliente, no caso a Força Aérea e depois o mercado da aviação comercial, ao invés de apenas a expectativa de um “projetista-chefe”, por mais brilhante que ele fosse.
Imagens do site https://pt.wikipedia.org/wiki/Embraer_EMB-110
O segundo par tem o Xingu (EMB-121) e o Brasilia (EMB-120). O Xingu foi a primeira aeronave pressurizada desenvolvida pela Embraer, com atuação no transporte executivo. Foram pouco mais de 100 aviões entregues, com cerca de 40 deles para a Força Aérea Francesa. Um dos problemas associados na baixa comercialização foi o seu alto peso em função de uma estrutura de pressurização super-dimensionada. Este aprendizado foi essencial no desenvolvimento do Brasilia, com entregas em torno de 350 aeronaves, sendo o segundo mais vendido na sua categoria, perdendo apenas para o Saab 340, com pouco mais de 450 aeronaves.
Imagens dos sites https://pt.wikipedia.org/wiki/Embraer_EMB-121 e https://pt.wikipedia.org/wiki/Embraer_EMB_120
O par com maior contraste é feito pelo CBA-123 e o EMB-145, que posteriormente virou uma família conhecida comercialmente pela sigla ERJ. O CBA-123 não teve nenhuma unidade comercializada, apesar de 3 protótipos terem sido construídos: dois para vôo e outro para ensaio estrutural estático. A aeronave foi idealizada para substituir o Bandeirante, mas o projeto foi cancelado em função da retração do mercado e dificuldades financeiras da Embraer. Na verdade, o mercado provavelmente teria comprado o CBA caso ele estivesse próximo da necessidade das companhias aéreas, mas o foco no seu desenvolvimento foi no lado técnico, incluindo vários avanços tecnológicos, como uma asa super crítica e sistema brake-by-wire.
Imagem do site https://pt.wikipedia.org/wiki/Embraer_CBA-123
O EMB-145 foi lançado em 1989 em uma configuração bem diferente da versão final, com asa reta e motores na parte superior da asa. Após ser verificado que a configuração não era viável tecnicamente, o projeto foi revisado, passando a ter os motores suspensos em uma asa enflechada.
Imagens do site https://en.wikipedia.org/wiki/Embraer_ERJ_family
Uma nova, e última, revisão levou os motores para a fuselagem traseira. Esta modificação ocorreu dentro do (re)aprendizado de que o mercado é quem conhece as suas necessidades, o que levou ao uso do lema “Back to Basics”, ou seja, de volta ao que foi aprendido lá no Bandeirante.
Imagem do site https://en.wikipedia.org/wiki/Embraer_ERJ_family
O EMB-145 acabou virando a família ERJ, com o ERJ-135 (37 passageiros) e o ERJ-140 (44 passageiros), além do ERJ-145 (50 passageiros). Este foi um aprendizado muito importante para melhor atender a oportunidades de mercado. Mais de 1.000 unidades foram comercializadas, além da plataforma ter sido utilizada para aviões executivos e de vigilância aérea.
Todo esse aprendizado levou ao lançamento da família dos E-Jets, que segundo o plano de negócios inicial contemplava os modelos E-170, E-190 e E-195. Logo após o início do programa foi acrescentado o modelo E-175, que viria a ser o último modelo a ser certificado para operação. Esta decisão de inclusão se mostrou muito acertada já que esta aeronave, em 31 de março de 2020, representava 637 entregas de um total de 1.564 de toda a família, com mais 163 pedidos firmes. O modelo E-170, inicialmente considerado o mais promissor, tanto que foi o primeiro a ser certificado, corresponde a um pouco menos de 200 entregas sem novos pedidos, ou seja, um posicionamento bem inferior. Isto precisa ser enfatizado, pois se a Embraer não tivesse aprendido o valor de se ter uma família de aeronaves, o lançamento do E-170 poderia ter sido um pequeno fracasso, em alinhamento com a sequência histórica de “fracasso-sucesso-fracasso”.
O sucesso depende de saber entender o mercado e ser flexível na sua proposta de solução.
Autor: Hugo Resende, com 26 anos de experiência na Embraer, tendo atuado no Desenvolvimento de Produto (CBA-123, ERJ-145), Pesquisa Aplicada (famílias ERJ e E-Jets E1), e Marketing da Aviação Comercial (E-Jets E1 e E2). Apaixonado por aeronáutica desde a infância, quando seu pai foi piloto de provas ainda do Bandeirante, com Ph.D. em Engenharia Aeronáutica por Stanford, EUA.
Sites utilizados
Bandeirante: https://pt.wikipedia.org/wiki/Embraer_EMB-110
Xingu: https://pt.wikipedia.org/wiki/Embraer_EMB-121
Brasilia: https://pt.wikipedia.org/wiki/Embraer_EMB_120; https://pt.wikipedia.org/wiki/Saab_340
CBA-123: https://pt.wikipedia.org/wiki/Embraer_CBA-123
Família ERJ: https://pt.wikipedia.org/wiki/Embraer_ERJ; https://en.wikipedia.org/wiki/Embraer_ERJ_family
Família E-Jets: https://pt.wikipedia.org/wiki/Embraer_E-Jets; https://en.wikipedia.org/wiki/Embraer_E-Jet_family
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